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2447104                            08620.007609/2020-76

Timbre

MINISTÉRIO DA JUSTIÇA E SEGURANÇA PÚBLICA

FUNDAÇÃO NACIONAL DO ÍNDIO

 

Informação Técnica nº 31/2020/CGETNO/DPDS-FUNAI

Em 08 de setembro de 2020

Ao Senhor Procurador Chefe

 

Assunto: Termos de Cooperação Técnica Agrícola - TI Sangradouro

 

Tratam-se de propostas de contratos denominados Termos de Cooperação Técnica Agrícola, firmados entre particulares e a Cooperativa Indígena Sangradouro e Volta Grande (COOIGRANDESAN). Os documentos foram entregues na Presidência da Funai em versão física no final do mês de maio (SEI n° 2446978) e entregues a esta CGETNO em junho. Esta Informação Técnica visa realizar uma análise do ponto de vista técnico sobre a viabilidade da proposta encaminhada à Funai.

Cabe, porém, ressaltar que, a meados do mês de junho, o principal signatário dos Termos de Cooperação Técnica Agrícola, também Presidente da Cooperativa, o cacique Domingos  Mahoro’e’o contraiu o coronavírus e veio a óbito no dia 06 de julho de 2020. Entendendo que o povo Xavante foi o que apresentou a maior letalidade frente à COVID (Chegando a quase 10% no mês de agosto), a análise técnica foi sobrestada nesse período até nova motivação por parte dos representantes dos particulares neste início de setembro.

Inicia-se, neste documento, por uma breve reflexão do ponto de vista da estrutura dos termos em três pontos principais, para depois, realizar uma análise inicial de viabilidade técnica.

 

dOS TERMOS DE COOPERAÇÃO TÉCNICA AGRÍCOLA

 

Dessa forma, os Termos de Cooperação Agrícola, conforme foram assinados, preveem para a Cooperativa as seguintes obrigações (Ver Cláusulas Terceiras Termos 1 a 6 em SEI n° 2447054, 2447067, 2447085, 2447094, 2447101 e 2447111):

a) Fornecer a área para cultivo devidamente demarcada por coordenadas geográficas, com anuência da FUNAI e devidamente liberada pelos órgãos ambientais;
b) Responder aos processos ambientais e políticos para garantir o uso agrícola da área.

Já para os cooperantes, nessa mesma Cláusula, temos que:

a)  Avaliar tecnicamente as áreas disponibilizadas para plantio e implantar as culturas respeitando as técnicas exigidas pela Legislação vigente no Estado pelas expensas do COOPERADOR.
b) Prestar assistência técnica nas Lavouras de Cooperação.
c) Orientar as atividades inerentes a execução da lavoura Cooperativa dentro das áreas envolvidas, verificar a exata aplicação dos insumos e avaliar os resultados por meio dos profissionais habilitados.
d)  Promover, sempre que possível, metodologias participativas que envolvam a Cooperativa, tais como cursos de capacitação, dias de campo e outras, principalmente sobre os seguintes temas: tecnologias apropriadas à condução das lavouras comunitárias e formas cooperativas de produção.
e) Utilizar sempre que possível o controle biológico de pragas, doenças e invasores.
f)  Utilizar até 25% (vinte e cinco por cento) de mão-de-obra, através de povos Indígenas, os quais terão que ser qualificados pelo SENAR e SINDICATO RURAL PATRONAL DE PRIMAVERA DO LESTE/MT.
g) Acondicionar devidamente, de acordo com a legislação, as embalagens de defensivos utilizadas.

O segundo ponto que merece destaque é o modo de pagamento escolhido no processo contratual:

DA PARTILHA
Tendo em vista que a área a ser explorada encontra-se bruta sem nenhuma benfeitoria, e todo o processo de abertura, correção e adubação do solo ocorrerá por expensas do COOPERADOR este, repassará para a COOPERATIVA, na primeira safra 01 (uma) saca de soja por hectare, as quais irão acrescendo, anualmente, em 01 (uma) saca de 60Kg a cada safra, até chegar à totalidade de 10 (dez) sacas de 60Kg de soja por hectare no décimo ano, padrão comercial, que serão depositados em armazém indicado pela COOPERATIVA.

Parágrafo primeiro: Fica avençado, ainda, que na safra 2023/204 (sic) em diante, sem prejuízo das sacas de soja estipulado no "caput" dessa cláusula, obrigatoriamente será acrescida 01 (uma) saca de milho de 60Kg, fixo, por hectare até o décimo ano, padrão comercial, que serão depositados em armazém indicado pela COOPERATIVA.

Por fim, o último quesito a destacar é o prazo de vigência que é de dez anos a contar da safra 2020/2021.

Sobre esses três pontos, cabem as reflexões abaixo. Na primeira responsabilidade do indígenas, de "Fornecer a área para cultivo", seria necessário verificar se há conformidade se contrastada com as salvaguardas emitidas na PET 3.388. Neste caso, inclusive, os Termos fixam um percentual máximo (e não mínimo) de trabalhadores indígenas "Utilizar até 25% (vinte e cinco por cento) de mão-de-obra, através de povos Indígenas" e se isso compromete a posse indígena. Ademais, importante verificar se há tipificação dos contratos enquanto arrendamentos, mesmo que chamados de Termos de Cooperação Técnica Agrícola, quando se fixam valores de retribuições certas, escalonadas ao longo dos dez anos ("01 (uma) saca de 60Kg a cada safra, até chegar à totalidade de 10 (dez) sacas de 60Kg de soja por hectare no décimo ano" e "01 (uma) saca de milho de 60Kg, fixo, por hectare até o décimo ano").

 

da análise técnica

 

Do ponto de vista técnico, em resumo, o projeto propõe abrir uma área de pouco mais de 11.000 hectares na Terra Indígena Sangradouro, para plantio de grãos, em especial soja e milho safrinha. Conforme a Análise de Viabilidade Técnica no SEI n° 2447010, “os custos para os parceiros de 1.500 ha giram em torno de R$ 3.735.000,00 (...) que serão aplicados em 02 anos pois determinou-se que cada parceiros abrirá 50% da área por ano” e estariam distribuídos conforme os Mapas apresentados (SEI n° 2447010). Conforme seção acima, o modo de concretizar essa áreas produtivas seria por meio de Termos de Cooperação Técnica Agrícola.

Como é de amplo conhecimento, a cultura da soja requer de cuidados mais sofisticados de que outras culturas agrícolas devido a ter janelas mais estreitas para a aplicação de insumos, defensivos agrícolas e da própria colheita; falhas na mobilização dos recursos humanos e dos maquinários durante essas janelas podem levar a baixas consideráveis na produtividade, gerando grandes prejuízos.

Cabe destacar que, hoje em dia, os representantes do povo Xavante desta região possuem pouca experiência na administração de cadeias produtivas mais complexas do agronegócio, se comparados aos Paresi, por exemplo. Seria a primeira vez que os indígenas estariam envolvidos na plantação de soja e teriam uma enorme dificuldade de protocolar um processo de licenciamento ambiental, preenchendo a Ficha de Cadastro Ambiental no âmbito do SISLIC/Ibama. É claro que a Funai pode e deve assessorá-los nesse sentido, mas nossa opinião técnica é que isso deva ocorrer após os mesmos gerenciarem uma ou duas safras de uma cultura agrícola mais simplificada.

Da proposta contratual, verifica-se que todas as obrigações do ponto de vista técnico da produção estavam atribuído aos não-indígenas e os indígenas não possuem nenhuma responsabilidade nesse sentido; acredita-se na necessidade de focal em um processo de aprendizagem na prática em escala menor mas que, desde já, apresente obrigações técnicas aos indígenas.

Sendo assim, conforme seção a seguir, sugere-se redimensionar a área pensada para a produção, assim como adotar, em um primeiro momento, culturas agrícolas mais simples e em instrumentos de mais curta duração: entende-se que para preparar o plantio de soja seria necessário um investimento inicial grande, mas para um processo de aprendizado em menor escala, pode se pensar também em instrumentos com vigência de até 02 ou 03 anos, prorrogáveis por igual período. Ademais, é importante lembrar que, devido o falecimento do cacique Domingos, seria imprescindível verificar quem o substituiria na Presidência da Cooperativa, assim como quem representaria a Cooperativa nos novos instrumentos a serem assinados; e, nesse sentido, que os indígenas assumam melhor algumas atividades técnicas de acordo com a sua capacidade técnica já instalada.

 

ENCAMINHAMENTOS

 

Sugere-se encaminhar estas considerações à PFE para análise do ponto de vista jurídico. Após isto, podemos contribuir com a modelagem de um contrato que possa ser viável do ponto de vista técnico e jurídico. Posteriormente, poderemos encaminhar também esta manifestação ao Procurador da República que acompanha o caso para que também contribua com a modelagem contratual.

São por ora estas as informações.


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Documento assinado eletronicamente por JUAN FELIPE NEGRET SCALIA, Coordenador(a)-Geral, em 08/09/2020, às 18:37, conforme horário oficial de Brasília, com fundamento no art. 6º, § 1º, do Decreto nº 8.539, de 8 de outubro de 2015.


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Documento assinado eletronicamente por João Pinto Rosa, Diretor, em 08/09/2020, às 18:43, conforme horário oficial de Brasília, com fundamento no art. 6º, § 1º, do Decreto nº 8.539, de 8 de outubro de 2015.


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Referência: Processo nº 08620.007609/2020-76 SEI nº 2447104